sábado, 23 de janeiro de 2010

Tempos de utopia - Fundo do baú II

  É a falta de uma tal de liberdade da qual nunca experimentei o gosto.
  Do cheiro dos meus incensos não há mais  nem resquício.
  Dos meus amigos, dos meus arrebatamentos, dos meus antigos sofrimentos, dos meus quase tormentos, do meu sorriso despreocupado, dos meus beijos em lugares proibidos, dos meus falsos sentimentos desenfreados é que sinto falta.
  Falta de sair por aí, sem precisar dar satisfação a mim mesma pra ser feliz.
  Revolução em meus cabelos, muito vento na cara, muita noite estrelada, uma cara debochada e um mundo de palhaçada. Eu era dona do mundo e sabia disso. Pisava nele descalça com meus pés horrorosos e não me importava. Luzes de todas as cores, campos de muitas flores, um coração de mil amores. Era eu em carne e poesia. Sem estrutura alguma a não ser a poética. Minhas orgias verbais. 
   É disso que sinto falta.


  Começo a ler coisas de quem sabe escrever e sinto a necessidade de também o fazer pra tentar me sentir melhor: não funciona. Mas mesmo assim continuo até o ponto em que me sinto cretina e medíocre demais pra continuar e aí tento me quebrar. Então paro. Me desconcentro. Como alguma coisa - porque eu sempre preciso comer alguma coisa - e faço qualquer coisa que me aliene ou me impossibilite de pensar. Mas hoje não vou fazer isso. Quero ver até onde minha auto-estima aguenta ficar sufocada pelos meus defeitos. Estou tentando me livrar da superficialidade.
  Fico me forçando e experimentando até chegar ao limite da minha criatividade e ver o que acontece quando a ultrapasso. Mas minha mente é esperta e começo a sentir sono.
  Começa a chover. Uma chuva homogênea daquelas que se torce pra acontecer quando está prestes a dormir. Hoje quem vai velar o sono dela sou eu. Vou ficar aqui, parada. Mão em frênesi, sentindo ela até ela cansar de ser sentida, sentir muito e se retirar. Aí eu durmo. Assim eu descubro o que minha mente faz quando para de pensar.
  Minha mão para e meu pé começa. E descubro que por enquanto não consigo verbalizar tudo que quero. Minhas palavras me fogem e não adianta criar outras pois o problema não é escassez ou excesso, e sim questão de escolha. Sempre que há dois livros e tenho que escolher pego os dois, mas e as palavras? São muitas. Fico com todas e não escolho nenhuma. Preciso fazer uma propaganda melhor de mim mesma, pois não quero mais me comprar. Me falta ser atraente a  mim mesma.
  Me sobram olhos, me faltam observadores.

  Me sinto infeliz e não sei até quando isso vai durar. Não sei até quando eu vou durar. Mas ser infeliz dói mesmo que não mate.
  Minha mão está com um cheiro que não sinto há tempos. É quase descomunal manter os olhos secos, mesmo que simultaneamente eu tente forçar um sorriso pra compensar.
  É algo só meu. Essa tristeza, essa saudade, essa necessidade de me ver feliz. Chorar me consome muito e me sinto tão cansada. Me transbordar e sentir que pelo menos de uma maneira precária e inútil estou ultrapassando algum limite.
  Os meus demônios de hoje são diferentes dos de ontem, ou talvez sejam os mesmos mas com máscaras diferentes. A manutenção de novos demônios a cada novo tormento deve ser laborioso demais. Talvez agora devam investir em demônios mais versáteis. Agora mais que nunca estão os meus demônios, e são tantos! Já não sei mais o que fazer com eles. Não cabem mais no quarto então deixo a porta fechada para que ninguém os veja, e também não posso abrir a janela pois lá fora há muitos outros esperando pra entrar.  Pra não morrer sufocada acho melhor ficar em lugares grandes, sufoco menos.
  Minha privacidade foi violada. Durmo com meus demônios. Amanhã começa mais um dia e o Sol bem que podia achar algo mais importante pra fazer em vez de nascer.

Um comentário:

  1. Oi!! Algum tempo atrás passei por blogs de amigos e encontrei o seu por acaso, passei a admirar as coisas que vc escreve, mesmo sendo coisas tristes, pois na maioria das vezes corresponde com o meu estado de espírito, mas a vida é assim, cheia de altos e baixos o que temos que fazer é crescer e aumentar os nossos ideais. Mas é isso, caso queira conversar e ganhar mais uma amiga me contate pelo email rejane.libra@hotmail.com. Um grande abraço Rejane

    ResponderExcluir